Da preparação necessária
Quando fiz meus primeiros 4
Ironmans em anos consecutivos (2009 a 2012), eu estava ainda trabalhando
profissionalmente.
Depois desses 4 anos, decidi,
junto com a Neuza, que seria mais saudável, em todos os sentidos, realizá-lo a
cada 2 anos.
A preparação para um atleta
amador do meu nível (isto não é um auto-elogio, ao contrário) exige em média
meio ano de foco e dedicação.
Pulei 2013, fiz em 2014,
pulei 2015 e fiz em 2016.
Tudo ia nos conformes,
quando decidi fazer também em 2017, devido principalmente à mudança de
categoria. Estreei na 60-64.
Outro fator que me fez
decidir pela participação é que em 2016 eu estava muito bem preparado, mas, por
conta do clima e de um vacilo meu, não consegui correr como planejado (vide Relato de Prova do IMBR 2016).
Falei eu pra mim:
- "Ah... dois anos
seguidos com frio e chuva não vai acontecer."
Em 2013 e 2015, anos em que
não participei, soube que o clima foi extremamente agradável.
Em 31/12/2015, havia me
aposentado do trabalho profissional.
Logo, haveria maior
disponibilidade de tempo para dedicar quase que integralmente à preparação.
Ledo engano.
Hoje, tenho mais compromissos
do que tinha antes de me aposentar. Compromissos esses que variam em dias,
horários, finais de semana, etc.
E isto é apenas uma
constatação e não uma reclamação.
Considero-me afortunado
pelos compromissos assumidos.
Este preâmbulo é para dizer
que minha preparação não foi a ideal, porém, com toda a capacidade e
competência do coach, Silvio Luiz Marques, o Silvão, além de seu
comprometimento e entendimento para com os meus compromissos pessoais (isso
para não falar sobre a relação de amizade), cheguei à semana da prova me
sentindo o melhor possível para ela.
Também não posso deixar de
expressar meus agradecimentos ao Dr. Lucas Jankauskas que, mesmo sem horários
agendados, sempre me atendeu para manter o controle de minha saúde.
E também ao grande (grande
mesmo) André (coach de musculação), pelo fortalecimento que foi feito
anteriormente e que foi interrompido apenas pela minha indisponibilidade, mas,
que ajudou enormemente, ao menos na prevenção de lesões.
Ao mestre Atef (Quiro e
fisio) que, inclusive na véspera da viagem, me deixou em condições de lataria e
funilaria de semi-novo.
Decidi me manter o máximo
possível afastado dos ôba-ôbas pré-prova, das idas e vindas desnecessárias à
Expo, das redes sociais e de tudo o mais que nos consome energia sem nos dar o
devido retorno.
Recomendo fortemente isso a
todos os futuros Ironmans.
Na quinta-feira à tarde consegui
fazer um treino de natação (não o oficial), bastante útil para checar as
condições do mar, tanto de correntezas quanto de temperatura. Esta última
sempre fria nesta época do ano, porém não tanto quanto no ano passado.
Caraca! Acho que já tá na
hora de falar sobre a prova em si.
Ah, não... Ainda tem o
pré-prova... o bike check-in, etc.
Pré-prova
O kit deste ano foi
exatamente como a situação econômica do país: pobre, para não dizer paupérrimo.
E já disse o que vem a
seguir várias vezes...
Não creio que algum Triathleta
faça qualquer prova em busca de um kit cheio de "agrados". Mas eles,
os "agrados", demonstram um pouco da consideração que a organização
tem para com os atletas. Mas, definitivamente, isso não é o mais importante.
Neste ano, a organização
acertou em cheio na questão de deixar as tatuagens no kit, para que as
aplicássemos sozinhos. Ano passado, houve uma perda enorme de tempo com a
aplicação dessas tatoos durante o bike check-in. Esse processo durou mais de
uma hora.
Acertaram também na
distribuição gratuita de capas de bikes (evidentemente do patrocinador máster).
Como chovia durante todo o
sábado, a transição ficou linda... um mar de capas brancas patrocinadas. Pelo
menos não eram Tabajaras. Também não eram daquelas que você faz questão de guardar.
Noite de sábado para domingo
muito chuvosa. E ventosa também.
4h da manhã e... acordado...
Acordaesfregaosolhosbocejalevantabocejalavaacarabocejadescepratomarcafébocejasobepra...
sevestebocejaarrumatodaastralhasbocejacolocaochipdescee.....
Ufa...bóra !!! (bocejos)
Cheganatransiçãoentranatransiçãotiraacapadabikecolocaastralhasnolugaracabadesearrumare...
Ufa...bóra pra largada !!! (bocejos)
Chove a cântaros.
Sempre ouvi essa frase e,
desta vez, pude entender o mais profundo significado dela.
Achei que deveria ter
entrado no mar antes da largada, para aquecer, mas, novamente não tive coragem.
Frio, chuva, escuridão.
Largada dos profissionais às
6h45m.
A minha às 7h15m.
Meia hora esperando molhado?
Preferi sofrer apenas uma vez.
LARGOU !!!
Natação
Consegui colocar meus
conselhos em prática. E é raro isso. Sou bom para aconselhar e péssimo para
seguir meus próprios conselhos.
Entrei no mar bem devagar...
dei alguns mergulhos... deixei entrar água fria na roupa... comecei a nadar em
ritmo de cruzeiro.
O mar estava bem tranqüilo.
Não ventava. Embora a chuva continuasse, a visibilidade desta vez não estava
ruim. A temperatura da água tampouco.
Saí do mar com ótimos 1h15m.
Estava prevendo algo em
torno de 1h25m.
Quase chegando à primeira
bóia, um cardume da largada posterior me atropelou. Literalmente. A ponto de
algum atleta passar por cima de mim abrindo o velcro da nuca da roupa de
borracha.
Ela estava certinha. Sem
machucar. Tive que fechar o velcro de qualquer jeito e continuar. Ganhei uma
assadura, queimadura, machucado monstro na nuca. Mas, tá valendo.
Um aparte...
Ainda penso que a largada
sem ser em ondas é melhor.
Em cada bloco de atletas
existem os nadadores, os intermediários e os não nadadores.
Na largada coletiva, é uma pancadaria apenas nos 200, ou no máximo
primeiros 300 metros.
Depois, cada um vai achando
seu espaço e a coisa vai fluindo.
Aliás, a etapa em água é
realmente para fluir.
Na largada em ondas, os nadadores de cada largada posterior vão
atropelando os não nadadores e os intermediários o tempo todo.
E isso causa um desconforto
enorme para esses dois tipos de atletas. Para não falar de riscos. Os nadadores
pegam no pé (literalmente, novamente), passam por cima, dão porrada, enfim... não
respeitam os demais.
Senti isso na pele, mas, foi
apenas uma vez. E isso me aporrinhou bastante. Imagino os demais.
Ultrapassei muitos não
nadadores que largaram antes, porém sempre tendo o cuidado de não prejudicá-los.
Como comecei minha natação
muito leve, acabei ultrapassando durante o percurso vários atletas que largaram
junto comigo.
Vi uma atleta ser
praticamente afogada por um atleta que largou depois e que ainda gritou pra
ela:
- "Sai
da frente, caraleo !!!".
Bom, me enganei... isso não
é atleta. É apenas um serumanu metido a fodão.
Xápralá.
Na corrida pela areia, no
meio da natação, vi outra cena hilária.
Eu, como já disse, me
programei para fazer tudo, o tempo todo, tranquilamente.
Saí do mar caminhando, tirei
o gel que levei na manga da roupa, ingeri, dei um trote até a hidratação,
peguei água para dar uns goles antes da segunda perna da natação, quando vejo,
ou melhor, ouço, um outro "atleta", atrás, dando um Sprint de Bolt,
derrubando tudo e todos, gritando o famigerado "SAI DA FRENTE CARALEO",
pegando água e... jogando na cabeça... com touca de natação e tudo. Acho
que ele já estava na etapa da corrida... rsrsrs.
Gritei pra ele:
- "Calma...a
vaga já é tua !!!".
Ouvi algumas risadas da
galera (mas, juro, essa não era minha intenção).
Aí, o cara olha pra trás,
provavelmente na intenção de me xingar e... pá... tropeça em algo (creio que no
ego) e... puf! Cara na areia.
Levanta, sacode a poeira (ou
areia) e dá a volta por cima.
Foi-se... Que ele não leia
este relato. Ou que leia.
Minha 2ª perna de natação
foi idêntica à 1ª. Muito boa.
Transição 1
Uma demora tipo
inacreditável... 20 e poucos (ou muitos) minutos.
A média, pelo que vi, são 11
minutos.
Mas, me precavi muito devido
aos problemas do ano passado.
180 km de pedal, com chuva.
Pneus jogando água de chuva com resíduos dentro da sapatilha... teus pés com
meias molhadas pressionando o pedal muito mais para baixo do que puxando-os... pele
da sola (mesmo que cascão como a minha) ficando mole... bolhas aparecendo...
Ah... que nada!
Perdi muito tempo, e não me
arrependo, passando bastante creme nos dois pés inteiros.
Perdi tempo também para
colocar a roupa de pedal, organizar a alimentação nos bolsos, etc.
Mas, acho que, na verdade,
ganhei tempo.
Se não tivesse feito tudo isso,
iria me funhanhar no resto da prova.
Ciclismo
""Tá chuvendu aí ?
Aqui tá chuvendu...
Chuveu a noite inteira e
continua chuvendu.""
Esse áudio ficou famoso nas
redes sociais.
E no ciclismo eu pensava
nele o tempo todo... rsrsrs
Fiz o ciclismo dentro
daquilo que treinei.
Porém, a chuva... ah, essa
chuva... me deixou travado... porque descer as serrinhas de Floripa a 60 kmh,
com água na pista... sem ver onde havia buracos (e havia muitos)... travado no
guidão a ponto de ele tremer...
Eu começava a frear no
começo das descidas... aí, via os caras me passando como se eu estivesse
parado. Deixava embalar um pouco e freava quando começava a passar dos 45 km/h.
E quem disse que a porra da
bike diminuía a velocidade? Ia de 45 para 50, 55, 57... até o momento em que eu
nem encostava no freio. Tinha a nítida impressão que um toquinho nele seria
chão.
Em algumas descidas, eu
jurava que não estava no controle da bike. Que estava aquaplanando.
A boa notícia é que finalmente
acho que me alimentei e hidratei adequadamente. Porque, marinheiro de sétima
viagem que sou, não havia acertado em nenhum treino longão.
Finalizei o pedal com 6h34m
(acho) honestamente cumpridos.
Sim... HONESTAMENTE
CUMPRIDOS.
Até porque alguém que não
faça o pedal honestamente, com a cara no vento, durante 180 km, irá ter um
tempo pior.
Vi muitos pelotões, pelotes
e pelotinhos me ultrapassarem e, juro, dá uma vontade danada de acompanhar... mesmo
que numa distância digamos, regulamentar.
No plano, eu pedalo numa
velocidade de Iron de 34 a 36 km/h.
Pelotes me ultrapassando a
40, 40 e poucos km/h, seria bico acompanhar de roda.
Mas o que eu ganho com isso?
Inflar artificialmente o meu
ego. Apenas isso.
Nada como um pedal honesto.
Transição 2
Nada de anormal.
Essa eu fiz em
aproximadamente 11 minutos, quando a média é de 6 minutos. E também não me
arrependo. Segui todo o protocolo que havia planejado, principalmente os
cuidados com os pés.
Ainda tomei meia garrafinha
de Pedialite (soro), antes de sair para correr.
Também recomendo fortemente.
Corrida
Embora tenha feito uma etapa
de ciclismo bastante cautelosa, saí para correr com as pernas totalmente
travadas.
Disse o Silvão, em termos um
pouco mais técnicos, que foi algo como "contratura não sei o que, devida
às descidas de bike".
Concordei e concordo. Sentia
meus anteriores das coxas queimarem nessas descidas.
Pura tensão.
Mas resumo isso como cagaço
mesmo.
Este ano estava também
confiante em minha corrida. Não tanto quanto no ano passado, mas estava.
Daí, todos os cuidados com
os pés e toda a concentração e conseqüente "perda" de tempo nas
transições.
Os primeiros 10 km da perna
longa de corrida fiz na base da sofrência.
FC baixa, vontade de correr,
mas quem diz que as pernas respondem?
Aí, plano B em ação. Passar
pela sétima vez o pórtico de chegada, sem pensar em record pessoal, tempo de
prova, classificação y otras cositas más.
Dores nos anteriores das
coxas e, talvez, por isso mesmo começaram dores na lateral externa do joelho
direito.
Continuei na base do "vai
passar". E não é que foi passando?
Aos poucos... bem aos poucos
mesmo... fui pegando o jeitão da corrida.
Cheguei ao cantinho da
depressão (aquela subidinha do retorno da corrida na estrada) me sentindo
melhor do que quando comecei a correr.
Fechei os 21 km já melhor e
comecei as duas voltas finais me sentindo cada vez mais solto.
Não dei mole para
alimentação, suplementação e hidratação, embora isso exija um certo foco no que
estamos fazendo e, naquelas horas, eu queria mais era usufruir de mais um Iron,
confraternizar com atletas de qualquer faixa etária que estivessem próximos,
com os staffs e até com as poças d'água pelo caminho.
Quando iniciei a última
volta de 11 km, já tinha certeza de que esse Iron não seria o melhor, mas seria
o que eu terminaria melhor.
E assim foi.
Imagino o que os ETs, que
fazem essa prova em tempos de 10 horas para baixo, pensam quando nos
ultrapassam na corrida, fechando suas provas enquanto ainda vamos para mais 2
voltas de 10 e 11 km respectivamente.
Faço umas propostas
indecorosas a eles querendo comprar uma pulseira... mas, ninguém me dá
bola...rsrsrs
Boas lições
Fiquei orgulhoso por um
atleta que alcancei, perto do meu km 14, e ele foi me acompanhando, e eu a
ele... Só que ele já estava com as 2 pulseiras... iria fechar a prova... e eu
sem nenhuma... iria completar minha primeira volta.
Ficamos um puxando o outro e
conversando...
Como sempre falo, não há
competição desse tipo em que não tiramos lições de vida.
Eu, brincando com ele, dizia
que daria tudo para estar no lugar dele... já completando a prova... E ele
dizendo que queria muito estar no meu lugar, com a minha idade.
Parece sacanagem... que
estou velho... mas me senti muito orgulhoso... o cara é da categoria 25-29... Poderia
ser o pai dele... ou, nos tempos de hoje, até mesmo o avô... kkk
Completamos a minha volta (e
a de encerramento dele) juntos... Dei os parabéns a ele e ele a mim.
Minha última volta foi só
alegria... em todos os postos de hidratação brincava com o pessoal... pedia um chopp...
uma caipirinha... lógico que só na farra... ou não... kkk
Chegada
Em meus 6 Irons anteriores,
na reta de chegada, chorava como uma criança.
Neste ano, chorei novamente,
mas não como nos anos anteriores. Era meio um choro incontido e contido ao
mesmo tempo... de agradecimento, por estar tão bem de saúde, tão bem
acompanhado física e espiritualmente, enfim...
Nos últimos 100 m, diminuí
bem a passada para curtir os parabéns de gente que nunca vi na vida, de gente
do bem, que torce por você sem te conhecer, de atletas que já terminaram há
algumas horas e, ainda doloridos que estão (pois ninguém termina um Iron sem
dores), largam suas tralhas nas mãos de alguém e te acompanham por alguns
metros te incentivando... Esse, para mim, é o verdadeiro espírito Ironman... é
o verdadeiro espírito ALOHA.
Terminei bem, a ponto de, ao
ultrapassar o pórtico de chegada, dar uma comemoração tipo Pelé... saltando e
socando o ar.
O tempo... não foi meu
record, tampouco o idealizado e tampouco o importante.
O importante foi a somatória
das coisas.
Muito feliz.
Agradecimentos
Agora os agradecimentos mais
importantes.
Sem menosprezar os
anteriores.
Em primeiríssimo lugar, ao
nosso Pai Oxalá. A todos os meus Orixás. Meu Anjo de Guarda e seus Guardiões.
Minha mulher, esposa, amiga
e incentivadora Neuza.
Minha família, Fredão... meu
irmão mais "antigo", conselheiro, meteorologista, editor e cúmplice.
Meu irmão Zé Roberto que,
além de torcedor ferrenho, nos acolhe em sua casa em Jaraguá do Sul-SC, como se
fosse nossa própria casa.
Minha irmã Fátima, que
sempre emana suas melhores energias e, finalmente, a todos os familiares da
Neuzita (não vou citar porque vou deixar alguém de fora) que, com sua torcida,
orações, etc., fazem com que tudo sempre dê certo.
E se não deu certo é porque
não acabou.
Agradecimentos imensos
também a todos os amigos novos, que nem imaginava que estavam acompanhando e,
mais ainda àqueles antigos (tipo Denilson, Márcio e Clévio), que mandaram boas
energias e ainda me cumprimentaram após a prova.
Vocês todos são PHODA !!!
Sei que deixei de falar
sobre algo ou agradecer a alguém... mas...
ALOHA!
E as inscrições para 2018 abrem dia 14/06/2017 às
11:00AM.
Eu tô fora. Ou não... kkk
3AV
Marco Cyrino