Lembrei deste assunto por ocasião de uma Auditoria
de Sistema de Gestão da Qualidade, na empresa em que trabalho.
A criação de um Sistema de Gestão talvez seja o que
melhor representa a necessidade de haver protocolos.
Enquanto o Auditor, acompanhado por mim, percorria
as várias atividades da empresa, comecei a pensar na relação “protocolos” x
“dia-a-dia”.
A correlação com os protocolos voltados às
atividades desportivas foi direta.
Protocolos
De forma abrangente o termo
"protocolo" se aplica aos procedimentos padronizados, em incontáveis
áreas do conhecimento humano, utilizados para analisar, diagnosticar,
prognosticar e prescrever (potenciais) soluções para quaisquer tipos de situações.
Tais situações podem
envolver - isolada ou conjuntamente - desde um desejo ou necessidade individual
(ou coletiva) de melhoria / evolução em alguma atividade, até problemas
médicos, biológicos, esportivos, ambientais, geológicos, econômicos, políticos,
informáticos, de engenharia e técnicos em geral... A lista é infinda.
Sem chances para o acaso
Freqüentemente, como
resultado do consenso entre especialistas da área, o protocolo objetiva
enfrentar da maneira mais segura, rápida, eficaz e com as melhores armas, um
inimigo poderoso, que pode ser uma doença, um evento emergencial, um acidente,
uma calamidade qualquer.
São rigorosamente definidos
em seus critérios de diagnósticos, prognósticos, prescrições, tratamentos etc.
É o caso, por exemplo, dos
abençoados oncologistas que, dia a dia, vêm debelando diversos tipos de
cânceres e melhorando a expectativa e a qualidade de vida dos pacientes.
Outro exemplo, os
procedimentos de emergência para gestão do sistema elétrico de um país, ou de
alguma de suas unidades (uma hidrelétrica ou usina nuclear, por exemplo).
Outro exemplo ainda, bem
simples, o "protocolo" de "tratamento e cura" do motor de
um carro que "ingeriu" água (num alagamento, por exemplo):
desmontagem total, lavagem química, substituição de componentes avariados etc.
etc.
Condicionamentos em atitudes e procedimentos
Por outro lado, determinadas
atitudes e procedimentos condicionados parecem estar programados nas mentes de
muitos profissionais (especialistas também em incontáveis áreas) e acabam sendo
apresentados ou mencionados como "protocolos", às vezes até como
forma aumentar a credibilidade daquilo que se está comentando, recomendando, ou
prescrevendo.
Infelizmente, de maneira
geral, tais condicionamentos parecem ser predominantes, embora existam exceções.
Para aclarar, podemos
exemplificar com situações típicas:
1 - Um paciente reclama de um efeito colateral de um medicamento.
O remédio foi prescrito
recentemente.
O sintoma é daqueles que, no
mínimo, afetam fortemente a qualidade de vida do paciente.
O médico, sabedor de que tal
efeito colateral só se manifesta em 0,0001% dos casos (1 em cada 1000.000
pacientes) , afirma categoricamente que o paciente está enganado. (Postura
comum, já presenciada dezenas de vezes...)
Suponhamos que não se trate
de um medicamento insubstituível, nem de um caso do tipo "se ficar o bicho
come, se correr o bicho pega" (quando deixar de tomar a medicação seria
pior ainda do que o atual efeito colateral).
Nesta situação, em sua
postura "condicionada", o médico desconsiderou a possibilidade de seu
paciente ser um dos tais "1 em 1 milhão" que apresentariam aquele
efeito colateral.
Provavelmente, manteve a
medicação... e o prejuízo à qualidade de vida do paciente.
2 - O computador de uma pessoa sofre um crash e não inicia mais.
Como a maioria dos usuários,
a pessoa não tem o hábito de fazer backups regularmente.
Seu computador guardava
informações e arquivos importantes, trabalhos em andamento etc., boa parte dos
quais não se encontram em nenhuma outra mídia (CDs, DVDs, pendrives, etc.).
A pessoa chama um técnico de
informática.
Existe a opção de acessar o
diretamente o disco do computador, ou utilizar um aplicativo de recuperação de
dados, para salvar os arquivos importantes em um meio externo (pendrive, por
exemplo), o que pode consumir algumas horas de trabalho, que poderiam ser
utilizadas em muitas visitas a outros clientes.
Diante disto, o técnico
declara que a única solução consiste em formatar
o disco e reinstalar o sistema operacional --- o que consumirá bem menos
tempo e provavelmente devolverá ao cliente um computador funcionando, mas sem os seus arquivos e informações.
Desnecessário comentar os
prejuízos para o cliente...
3 - Uma pessoa leva o carro ao mecânico, para trocar uma peça
sabidamente defeituosa.
O procedimento técnico
correto exigiria remover antes determinados conjuntos mecânicos, para ter
acesso pleno à peça, poder usar as ferramentas certas, etc.
Mas, o mecânico adota um
"jeitinho" mais rápido, focado apenas no problema imediato.
Ele substitui a peça
"na marra", forçando outros grupos mecânicos, usando as ferramentas
(não necessariamente corretas) que couberem no espaço.
Evidentemente, o cliente sairá
da oficina com a peça nova instalada e funcionando, mas também com diversos
outros problemas "semeados" para futuros retornos...
Por quê?
O que leva a isto?
Excesso de confiança?
Relaxamento?
Descaso?
Esses são exemplos característicos de profissionais
que simplesmente não seguiram o chamado de protocolo.
Por outro lado, o “protocolo”, quando levado como
única verdade, também pode ser uma faca de dois gumes.
Canso de ver exemplos, alguns relacionados ao
esporte, de profissionais que seguem o protocolo até a morte, sem fazer uma
análise profunda das especificidades de cada pessoa.
O atleta vai se preparar para um Ironman, e seu
técnico aplica determinado protocolo de treinos que pode não se ajustar à
disponibilidade de tempo do atleta.
O que fazer?
Ignorar protocolo?
Esse mesmo atleta recebe de sua nutricionista uma
recomendação de ingerir uma certa quantidade de carboidratos, uma outra
quantidade de sódio e uma outra quantidade de líquido, por hora/treino.
Ele não se sente bem com as quantidades
recomendadas.
O que fazer?
Ignorar o protocolo?
Em seus exames de sangue, é constatado que o nível
de colesterol ruim (LDL) está um pouco acima dos níveis estabelecidos.
O médico recomenda que ele reduza drasticamente o
consumo de gorduras e, caso não os níveis não caiam, será obrigado a tomar
remédios para isso.
O que fazer?
Ignorar o protocolo?
O técnico deve ser profundo conhecedor das
necessidades do atleta, para ter meios de, seguindo um protocolo, como um
indicador, criar alternativas de treinos que permitam ao atleta chegar ao
Ironman estando em sua melhor forma.
A(o) nutricionista deve receber o feedback do
atleta, para também adequar as quantidades de nutrientes necessários durante os
treinos. Deve, inclusive, tentar fazer isso antes mesmo da primeira prescrição.
O médico, mesmo constatando um nível de colesterol
ruim um pouco acima do estabelecido, deve analisar outros dados, como o
colesterol “bom” (HDL) e muitos outros itens para estabelecer um quadro
concreto da saúde do paciente.
Enfim, o protocolo é um ótimo ponto de
partida, nem sempre de chegada.
3AV
Marco Cyrino